A 3 de novembro de 1930 Governo Provisório mandava ao Congresso o projeto de lei que asseguraria, dois anos depois, o direito das mulheres ao voto. Daí a data ser lembrada como ‘Dia da Instituição do Direito ao Voto Feminino’.
Iran Coelho das Neves*
03/11/2022 às 13:10:00
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Segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), aproximadamente 82,3 milhões de brasileiras (52,65% do eleitorado) estavam aptas a votar no segundo turno das eleições, no último dia trinta. Trata-se de mais um recorde, desde que as mulheres se tornaram maioria em 2002, quando representaram 50,9% do contingente eleitoral.
Embora essa expressiva vantagem não se traduza, lamentavelmente, em participação feminina nos espaços públicos de poder – em 2020, apenas 15% das pessoas eleitas eram mulheres –, é importante lembrar que um longo e meritório trajeto, iniciado há 92 anos, foi percorrido até aqui.
A 3 de novembro de 1930 era enviado pelo Governo Provisório ao Congresso o projeto de lei que asseguraria o direito das mulheres ao voto, daí a data ser comemorada como ‘Dia da Instituição do Direito ao Voto Feminino’. Contudo, poucos dias depois, a 11 de novembro, o mesmo Vargas dissolveria o Poder Legislativo, adiando por dois anos a edição do Código Eleitoral Provisório (Decreto 21.076/1932), onde enfim estaria inserido aquele direito.
Embora a luta das brasileiras pela conquista do direito de votar tenha seus primórdios ainda no século XIX, a primeira associação voltada à defesa da participação da mulher na política foi criada em 1910, sob o nome Partido Republicano Feminino, liderado pela professora e indigenista Leolinda de Figueiredo Daltro.
Na década de 1920, a zoóloga e sufragista Berta Lutz funda a Federação Brasileira pelo Progresso Feminino (FBPF), aliada ao movimento feminista internacional e empenhada em “assegurar à mulher os direitos políticos que a nossa Constituição lhe confere e prepará-la para o exercício inteligente desses direitos”.
A intensa mobilização da FBPF e de outras lideranças, como Elvira Komel e Natércia da Cunha Silveira – dissidentes de Berta Lutz –, rompera, ao longo dos anos vinte, boa parte da resistência do ‘conservadorismo patriarcal’ ao voto feminino. Não por acaso, logo após tomar o poder à frente da Revolução de 1930, o hábil Getúlio Vargas convoca as três líderes como assessoras da subcomissão legislativa que estudaria a reforma eleitoral.
Graças à pressão articulada pelas sufragistas, suprimiu-se do anteprojeto a proposta que restringia a mulheres que tivessem renda o direito de votar. O que deixaria de fora solteiras dependentes financeiramente e casadas donas de casa.
A vitória da pertinácia de Berta, Elvira e Natércia não foi total, mas com a nova lei eleitoral de 1932, incorporada à Constituição de 1934, todas as mulheres brasileiras, maiores de 21 anos, alfabetizadas e assalariadas, passaram a ter a obrigação de votar. A Constituição de 1937, outorgada sob Vargas, manteve diversas restrições, inclusive a que vedava inscrição eleitoral de mulheres que não exercessem funções remuneradas.
Ainda que o direito ao voto tenha sido estendido a todas as mulheres na Constituição de 1946, somente em 1965, com a edição do Código Eleitoral até hoje em vigor, esse direito estaria definitivamente consolidado.
Este breve resumo esboça o que se pode definir como jornada civilizatória empreendida pela mulher brasileira ao longo de quase todo o século vinte, para conquistar o pleno direito de votar e ser votada. Neste sentido, a expressiva maioria feminina (52,65% ou 82,3 milhões de eleitoras), registrada no último pleito, confere significado transcendente ao papel da mulher na construção, sempre em curso, de nossa democracia.
Há, porém, um longo caminho a ser percorrido: apesar de formar a maioria do eleitorado, nas recentes eleições as mulheres representaram apenas 33,6% das candidaturas, quase metade do número de candidatos homens (66,4%).